Greve nacional de caminhoneiros divide lideranças e pode começar nesta quinta
- Redação
- há 2 dias
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Movimentação liderada por Chicão Caminhoneiro ganha força nas redes, mas é rejeitada por entidades que afirmam que o ato assumiu caráter político e não representa a categoria

Caminhoneiros de várias regiões do país articulam, pelas redes sociais e grupos de mensagens, uma greve nacional prevista para começar nesta quinta-feira, 4. Apesar da mobilização, o movimento está longe de ser unânime: representantes históricos da categoria e entidades nacionais afirmam que não participarão da paralisação por enxergarem motivação política na convocação. A iniciativa é liderada por Franco Dal Maro, conhecido como Chicão Caminhoneiro, que esteve nesta semana no Palácio do Planalto para protocolar uma pauta de reivindicações e reforçar a possibilidade de paralisação caso não haja resposta imediata do governo.
“Estamos fazendo dentro da legalidade, protocolando na Presidência da República, conforme estabelece o direito de greve citado na Constituição brasileira”, afirmou Chicão em vídeo divulgado nas redes. Ele esteve acompanhado do desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), Sebastião Coelho, pré-candidato ao Senado pelo partido Novo, que declarou apoio jurídico ao movimento. “Estamos aqui para dar apoio jurídico ao movimento e, mais tarde, daremos mais informações”, disse Coelho, que anteriormente já havia agradecido a confiança de Chicão nesse processo.
As reivindicações entregues ao governo federal incluem estabilidade contratual para motoristas, reestruturação do marco regulatório do transporte de cargas, regularização administrativa de caminhoneiros autônomos punidos por atos anteriores, atualização do piso mínimo do frete com atenção aos veículos de nove eixos, além de medidas financeiras como congelamento de dívidas por 12 meses, refinanciamento em até 120 meses e criação de linhas de crédito de até R$ 200 mil.
Há ainda pedidos de aposentadoria especial após 25 anos de atividade comprovada, isenção de IPI para renovação de frota, ampliação dos pontos de parada previstos na Lei 13.103/2015, suspensão da obrigação da “Lei do Descanso”, criação de uma “Justiça do Transporte” e destinação de 30% das cargas de estatais aos caminhoneiros autônomos. A pauta, considerada extensa e de alto impacto regulatório, é vista por especialistas como politicamente sensível e de difícil implementação imediata.
Chicão afirma que o movimento não tem caráter ideológico. “Não podemos impedir o direito de ir e vir das pessoas, temos que respeitar toda a legislação que é imposta à categoria no sentido de permitir o livre trânsito das pessoas”, disse. No entanto, vídeos anteriores de Sebastião Coelho, que convoca apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro para uma paralisação pela “anistia ampla, geral e irrestrita”, chamaram atenção e aumentaram o distanciamento entre lideranças tradicionais e a mobilização atual.
A Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), que reúne nove federações e mais de cem sindicatos, afirmou que “não tem conhecimento sobre o movimento” e que não recebeu nenhuma solicitação formal. A posição reforça o isolamento do grupo que convoca a paralisação.
Wallace Landim, o Chorão, figura de grande influência na greve de 2018, também declarou que não participará. Ele reconhece que participou de uma reunião, mas recusou adesão ao identificar motivação política no ato. “É uma pauta do transporte, sim, só que estão levantando esse movimento com a questão política, para defender político A ou B – no caso, para defender o Bolsonaro. Eu não posso usar a categoria para fazer esse tipo de manifestação. Nós lutamos pelo sistema do transporte”, afirmou em vídeo.
Para Chorão e outros líderes, a ausência de consenso torna a mobilização frágil e sem força nacional. Eles lembram que movimentos espontâneos e não coordenados podem gerar bloqueios ilegais, punições e desgaste público para a categoria.
A possibilidade de uma nova paralisação reacende lembranças da greve de caminhoneiros de 2018, que durou dez dias e paralisou o país. À época, o aumento do preço do diesel e pressões sobre o governo Michel Temer levaram à interrupção do transporte de cargas, provocando desabastecimento de combustíveis, falta de alimentos em supermercados, redução da produção industrial, cancelamento de voos e prejuízos bilionários ao agronegócio. A crise obrigou o governo a criar subsídios temporários e estabelecer a tabela mínima do frete.
Conhecendo esse histórico, analistas afirmam que uma greve com impacto nacional dificilmente ocorre sem adesão das grandes entidades, que desta vez se mantêm afastadas. No entanto, destacam que paralisações localizadas, bloqueios pontuais e ações espontâneas podem ocorrer.
Sebastião Coelho, apoiador da mobilização, ressaltou que a adesão inicial deve ser pequena. “A paralisação deve ser por setores. A partir do início de algum setor, os demais vêm para agregar, para somar”, declarou. A fala indica que, mesmo entre os organizadores, há expectativa de um movimento gradual, sem paralisação imediata de rodovias.
O argumento de que o ato assumiu caráter político é o principal ponto de rejeição entre lideranças. Para muitos representantes, atrelar reivindicações econômicas e regulatórias ao debate político-partidário enfraquece a legitimidade da categoria e mantém os caminhoneiros em constante atrito com o governo federal, independentemente do conteúdo das pautas.
Ainda assim, Chicão mantém o discurso de que protocolou demandas dentro da legalidade e que aguarda retorno da Presidência. Segundo ele, a mobilização começará se não houver diálogo. “Agradeço a confiança do movimento. Não só agora, mas em todo o desenrolar desse processo”, afirmou.
Com diferenças internas profundas e discursos conflitantes entre seus representantes, o movimento previsto para esta quinta segue marcado pela incerteza. A ausência de apoio oficial das maiores entidades e o caráter politizado do debate dificultam adesão ampla, mas a mobilização nas redes sociais indica que grupos poderão realizar paralisações pontuais.
Para especialistas, o cenário atual não se assemelha à greve de 2018, mas revela que a categoria permanece fragmentada, com lideranças concorrentes e agendas divergentes. A resposta do governo à pauta protocolada, caso ocorra, deve indicar o rumo da articulação nos próximos dias.









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