Coluna “Check In do Direito” por Dra. Maria Luíza Fernandes no Blog José Patrício
- Dra. Maria Luíza Fernandes

- 11 de set.
- 4 min de leitura
Precisou cancelar sua viagem com bastante tempo de antecedência?
Saiba que você pode ter direito a 95% de reembolso, sobre o total pago
Imagine: você comprou uma passagem com meses de antecedência, a vida mudou, você precisa cancelar e, ao pedir o reembolso, a companhia aérea informa que vai reter 40%, 60% ou simplesmente não devolver nada. Respira fundo. Não é só a sua paciência que está sendo testada: é o seu direito.
Era terça-feira quando a professora Ana ligou para a companhia para pedir o cancelamento de sua passagem e recebeu a resposta que ninguém espera: “não conseguimos devolver o valro da passagem, apenas as taxas aeroportuárias”. O encanto da viagem virou dor de cabeça. Histórias assim viram rotina. E, como advogada com mais de 7 anos em experiência no direito do do passageiro aéreo, digo sem rodeios: você não precisa aceitar qualquer abuso, existem regras claras que protegem o passageiro.

O que a lei permite
De acordo com o artigo 740 do Código Civil, “o passageiro tem direito a rescindir o contrato de transporte antes de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem, desde que feita a comunicação ao transportador em tempo de ser renegociada”.
O mesmo dispositivo legal admite, em situações em que a comunicação foi feita com antecedência suficiente, que o transportador retenha até 5% do valor da passagem a título de multa compensatória. Ou seja: EM REGRA, VOCÊ TEM DIREITO A RECEBER 95% DO QUE PAGOU.
Tribunais e órgãos de defesa do consumidor têm decidido que retenções muito superiores a esse percentual, especialmente quando o passageiro solicitou o cancelamento com antecedência razoável, são abusivas.
Como isso se traduz em números (para ficar claro)
Suponha uma passagem de R$ 1.200,00 que você cancelou com antecedência razoável. O cálculo é simples e preciso:
5% de R$ 1.200,00 = 0,05 × R$ 1.200,00 = R$ 60,00.
R$ 1.200,00 – R$ 60,00 = R$ 1.140,00.
Resultado: você tem direito, na regra geral, a receber R$ 1.140,00 de volta. Não a menos, salvo se houver cláusula contratual legítima e proporcional que comprove prejuízo maior (e isso é raro). Use esse cálculo como parâmetro nas suas cobranças.
Justiça em ação: quando o reembolso negado gera indenização também por danos morais
Em recente decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo analisou o caso de um passageiro que, após o cancelamento de sua passagem aérea, passou anos tentando, sem sucesso, obter o reembolso dos valores pagos.
Diante do prazo absolutamente desarrazoado e das inúmeras tentativas frustradas de resolver a questão administrativamente, a Corte reconheceu a aplicação da Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor — que ocorre quando o cliente é obrigado a desperdiçar tempo e energia para solucionar problemas que não deveria enfrentar.
Nesse contexto, além do direito ao reembolso o Autor também teve direito ao dano moral, arbitrado em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). A sentença de primeiro grau foi reformada, e o recurso do autor provido, reforçando que a demora injustificada no reembolso de passagens aéreas pode gerar não apenas restituição de valores, mas também indenização por danos morais (TJ-SP, Apelação nº 1004684-30.2020.8.26.0428, Rel. Des. Ana Lucia Romanhole Martucci, j. 23/06/2022, 33ª Câmara de Direito Privado).
Passo a passo prático (o que fazer quando a cia tenta cobrar demais)
Peça o cancelamento por escrito - Salve prints de telas, e-mails e números de protocolo. Provas documentais valem ouro em uma disputa.
Exija a explicitação do valor retido (percentual/justificativa). Se o desconto for maior que 5%, peça fundamentação legal ou contratual.
Calcule você mesmo (como no exemplo acima) e informe o valor que entende devido. Mostre números, as empresas reagem à clareza.
Se houver negativa injustificada, procure uma advogada especialista em Direito do Passageiro Aéreo. Ela poderá analisar a retenção praticada, verificar a documentação que você reuniu e ingressar com a medida judicial cabível para garantir o reembolso devido.
Conclusão: não é só sobre dinheiro, é sobre respeito.
Cancelar uma viagem não é um favor que você pede; é o exercício de um direito. Quando a companhia aérea tenta transformar essa situação em lucro extra, ela testa o seu desânimo e ao ficar com o seu dinheiro pratica o enriquecimento ilícito, pois na grande maioria das vezes, o cancelamento da sua passagem libera aquele assento que seria seu para a venda a outro passageiro. Ou seja, a companhia aérea ganha duas vezes pelo mesmo assento e isso além de injusto é ilegal.
Não ceda ao silêncio. Documente tudo, exija a conta exata, use a legislação como escudo, e, se preciso, contate uma advogada especialista no direito do passageiro para receber o seu devido reembolso e, a depender da situação, buscar a indenização por danos morais para compensar o seu transtorno.
Afinal, a justiça também está no valor devolvido: receber o que é seu é recuperar não só o dinheiro, mas a sensação de que regras existem e servem para todos. Vá atrás dos seus 95%, com clareza, prova e coragem.
Se você viveu algo semelhante e tem alguma dúvida, terei o maior prazer em esclarecer as dúvidas sobre os seus direitos.
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